Uma defesa ao terceiro episódio de The Last of Us
No último domingo, dia 29 de janeiro de 2023, foi ao ar na HBO o 3º episódio de The Last of Us, série homônima da franquia de jogos exclusiva da Playstation (Sony). Entitulado de Long, Long Time, e com duração total de 75 min, o capítulo opta por se distanciar momentâneamente do núcleo principal da narrativa, incluindo um ponto de parada necessário na jornada de Joel (Pedro Pascal) e Ellie (Bella Ramsey): a casa de Bill e Frank.
Diferentemente dos episódios anteriores, nesse algumas escolhas narrativas da produção foram alvo de variadas críticas acerca da fidelidade com o jogo base. As reclamações compreendem a homossexualidade do casal Bill e Frank, também se estendem à mudança do Bill de lunático sobrivivencialista (aquele que vive em constante preparação para eventuais catástofres ou apocalipses) à durão romântico, bem como enxergam negativamente a desaceleração temporária da trama.
Refletindo um pouco sobre esses comentários, achei pertinente delimitar os motivos pelos quais eu, que também joguei o jogo homônimo, enxerguei tais opções narrativas como uma honraria à obra base, e não o contrário.
Falta de fidelidade ou LGBTQIA+fobia?
Preliminarmente é relevante tecer comentários sobre a “mudança” da sexualidade dos personagens. Há quem defenda que a série, com o intuito de lacrar (termo comumente utilizado por pessoas abjetas e preconceituosas), tornou Bill e Frank homossexuais. Um claro apontamento de quem só jogou The Last of Us (jogo) no intuito de dar tiros em infectados. Por mais que superficialmente, por meio de itens interativos dos cenários, e até mesmo de uma cutscene específica(momento dos jogos em que o jogador não tem controle algum da dinâmica, com cenas animadas que objetivam desenvolver a história), o jogo homônimo apontou que Bill era um personagem LGBTQIA+, da mesma forma que estabeleceu a existência de um vínculo afetivo forte entre ele e Frank, que sequer era vivo no período presente daquela narrativa.
Ademais, ainda que fosse uma mudança de fato, Bill e Frank serem ou não um casal LGBTQIA+ não afetaria em nada os objetivos do roteiro, que conseguiria perfeitamente atender ao ideal da narrativa. Sabendo disso, sem mais comentários a fazer, resta imaginar se a escolha de fazê-los dois amigos heterossexuais teria ensejado tanto burburinho sobre fidelidade. Esse preciosismo que se pauta nessa linha argumentativa é muito velho, e todo mundo sabe de onde vem.
Redução de marcha com a jornada de Bill, e a importâcia de viver, e não só sobreviver.
A necessidade da redução de marcha narrativa, em um primeiro momento, nos é demonstrada pela urgência de se obter recursos para a longa jornada de Joel (Pedro Pascal) e Ellie (Bella Ramsey), contudo, os minutos seguintes logo evidenciam a verdadeira premência desses personagens.
Somos atravessados por um flashback dos mais sensíveis e intensos da história do TV Show, que não se contenta em apresentar os personagens Bill e Frank, caracterizando-os e dando seguimentos divergentes aos do jogo. O ponto principal do episódio é a condensação da jornada de um homem completamente quebrado e sem propósito, que afetado pelo amor, tem o curso da sua vida plenamente alterado. Sim, essa descrição caberia tanto ao Joel quanto ao Bill, e esse é o grande trunfo do roteiro.
Além de precisar lidar com o impacto da morte da Tess (Anna Torv) nos protagonistas, o roteiro tinha a missão de reforçar a motivação de Joel e Ellie em suas trajetórias. É justamente dessa necessidade que vem a sacada genial do terceiro episódio, em unir os dois núcleos narrativos, utilizando a jornada belíssima e conclusa de Bill para dar combustível a um Joel que se encontra perdido, assim como o primeiro esteve no passado.
Bill teve uma oportunidade que poucos personagens tiveram dentro desse universo, a de viver e não só sobreviver. O outrora durão neurótico pôde usufruir de uma vida com sentimento e propósito relativamente tranquilos, e morrer dignamente ao lado de Frank, homem que felizmente amou até o seu último suspiro. Ele sabe das dificuldades, mas ainda assim, em suas palavras póstumas, deseja que Joel enxergue na Tess o seu propósito, sem saber que ela não estava mais entre eles.
É nesse momento que os núcleos narrativos se cruzam, ofertando não só um espaço de assimilação e ressignificação da dor para Joel, mas também fortalecendo o seu propósito, que agora atende pelo nome de Ellie.
Long, Long Time (ep 3, s1, The Last of Us, 2023), sem pressa alguma, nos introduziu ao início da dinâmica entre os dois protagonistas, além de nos brindar com uma das histórias de amor mais lindas de todos os tempos na cultura pop. Uma aula tanto de storytelling quanto de vida, que prenuncia a construção de mais um clássico do TV Show, e dificulta muito a vida de quem prefere não criar expectativas.


